quinta-feira, 26 de maio de 2016

Periciando o meu passado...

No meio do ano de 2014 decidi que era a hora de lutar pela realização de um dos meus sonhos , iniciar o curso de Psicologia. Posso dizer que tem sido dois anos de escolhas e adequações já que trabalho , sou casada e não moro perto da faculdade . O que tenho certeza é que as pessoas jamais imaginariam qual tem sido o meu maior conflito nesta história toda.
Toda a minha educação fundamental e do ensino médio foram em escolas publicas, tenho 4 irmãos, sou a  mais velha e somos uma escadinha,  três irmãs de 18,15 e 5 anos e um irmão de 3 anos, meu pai é cozinheiro e minha mãe do lar , que as vezes trabalha como domestica ou autônoma  ( com vendas de cosméticos) para complementar  na renda da casa.
Por conta desta rotina familiar, tive um papel de "mãe precoce" para as minhas irmãs e obrigações que jamais deveriam ser passadas para uma criança. Somente quando entrei na faculdade na minha primeira graduação e conversando com pessoas que não estavam na mesma posição que eu, que descobri que  havia exercido por anos , um papel que não era meu.

A dor

É  muito difícil escrever sobre isso, pois não sei se é possível traduzir com palavras a tristeza em pensar que não aproveitei a minha infância da forma que deveria ter aproveitado. Sempre me recordo das brigas com as minhas irmãs , da minha mãe me batendo ou pulando a janela para não apanhar, da chantagem de que se eu não arrumasse a casa eu não iria para escola, do horário do almoço fazendo uma omelete com 3 ovos e esquentando o arroz para nos arrumarmos e irmos pra escola.
Penso que algumas pessoas podem ler isso e pensar: "Mas que besteira, ao menos você tinha uma casa, uma família, não passava fome e estudava". Mas acredite em mim,quando escrevo que  ainda doí quando paro para recordar as fases que vivi , a  escola se tornou o meu "porto seguro"  os livros meus melhores amigos e consequentemente ser a "CDF" da sala foi o meu escudo por anos.
Sempre me senti a mais feia, magrinha e com roupas nada modernas atreladas a uma religiosidade , cansei de chorar até dormir  ou de esconder que gostava de algum menininho por vergonha dele não gostar de mim.
Com o tempo consegui um emprego como aprendiz com 16 anos e o mundo corporativo me ajudou a mudar de postura com relação a forma de me vestir , a me valorizar e quando inicie a faculdade com 18 anos eu sentia que podia ser feliz, que eu estava no caminho certo . Estipulei metas e posso escrever que 8 anos depois grande parte delas foram conquistadas.
Tive muita sorte em me casar com uma pessoa que  estimula o meu crescimento e ao pensar desta forma, vai tudo muito bem, obrigada!  Só que ao pensar na minha infância e adolescência, eu ainda sinto um vazio na alma que não consigo preencher , nem ao mesmo quando penso nas coisas que tenho conquistado.


De volta ao passado

Sempre que eu lembrava da escola, me vinha á memória momentos felizes , um lugar que eu conhecia , que eu dominava , me recordava da biblioteca como algo vivo e cheio de cores, da minha carteirinha da biblioteca e dos professores que sempre me apoiaram..
Até que neste semestre na faculdade estávamos procurando um lugar para fazer o estagio básico II e sugeri tentarmos na minha antiga escola . No primeiro dia que fui até a escola eu senti uma alegria enorme por voltar ao lugar que estudei por 7 anos, revi professores, funcionários e ao sair fiquei torcendo para que desse certo.
Fomos aceitos e eu mais dois colegas,  no primeiro dia de observação vi que as portas possuem chapas de ferro e trincos enormes , que o sinal  usado para o intervalo e troca de aulas parece uma sirene policial , identifiquei professores cansados e avistei alunos apáticos no intervalo. Fui até a biblioteca e não reconheci as cores de antes, o bibliotecário triste por que os adolescentes de hoje não querem mais ler, por conta do "WhatsAPP" .  Sai da escola com algo entalado na minha garganta, aquela vontade de chorar , uma angustia que me consumia, chorei em vários momentos do dia na empresa e cheguei a levar este fato para a supervisão na faculdade.
Primeiro eu não sabia explicar o que estava sentindo e  me veio a pergunta: "Era neste lugar que você era feliz?" e em seguida a resposta , que nem mesmo o lugar que eu achei que era feliz, hoje, na minha nova visão de mundo eu não consigo enxergar a felicidade.
E isso doí! Uma coisa é pensar que talvez em casa as coisas não eram como eu gostaria mas na escola eu era feliz, a outra é pensar que tudo não passava de uma ilusão.
Depois de vários dias pensando, aceitei que aquela era a minha realidade, e o fato de eu  ter mudado a forma de ver as coisas  , não anulou a felicidade que vivenciei naquele lugar.

E depois de anos, a dor desta ferida esta sendo tratada . Imaginava que com quase 25 anos eu já havia "esquecido " o meu passado, mas descobri que eu estava apenas postergando a minha dor e fugindo de uma solução. Assumir que algo te incomoda e que te faz chorar não é uma das coisas mais fáceis de se fazer, imaginei quantas pessoas possuem assuntos nada resolvidos como o meu e que infelizmente acabam se tornando doenças psicossomáticas com o tempo.
Neste processo tenho aprendido tantas coisas... a me amar mais, a acreditar mais no ser humano, a dividir  a minha bagagem pois não sou capaz de carregar o "mundo" sozinha e o melhor, que posso errar pois sou só uma menina, mulher em busca do melhor nesta vida.